#3 - Primeiros passos

Conhecendo substratos, técnicas de germinação e outros detalhes

Pode parecer a coisa mais fácil do mundo germinar uma semente, mas não há nada mais frustrante do que passar semanas olhando para o vasinho semeado, vendo brotar somente mato trazido pelo vento ao invés da sua plantinha.

No caso das pimentas, esse período é um tanto mais chato e arrastado, porque suas sementes podem germinar em pouco mais de uma semana, embora eu tenha plantas que só deram as caras dois meses depois de eu semeá-las.

Se vamos falar dos primeiros passos, é de se esperar que tratemos da germinação, e de suas técnicas. Mas antes, também precisamos entender um pouquinho sobre o substrato. Primeiro de tudo: eu recomendo plantar suas pimentas em vasos separados, e não diretamente sobre o solo. Existem argumentos à favor e contra cada forma de plantio, mas, para quem está chegando agora no mundo das pimentas, esteja avisado: elas são propensas à pragas e infestações.

Portanto, é melhor plantá-las em vasos, para que você possa separá-las caso um fungo, bactéria, inseto, ou ácaro apareça. Quando se está tratando infestações, ganhar tempo é fundamental, e claro, isso será tema de um texto futuro. Mas caso você prefira, mesmo assim, plantar sua pimenta sobre a terra, é bom que se conheça a terra, porque a planta é sensível à acidez do solo. Isso também vale para os vasos, porém, no caso dos vasos, também é mais fácil alcançar um equilíbrio que seja próprio para os pés de pimenta.

O caminho rápido e fácil, que é o caminho que ninguém (eu incluso) faz, é testar o pH do solo usando um kit de testagem ou um medidor digital. Hoje em dia acredito que quem opta por este método, usa o medidor digital, que é mais rápido. 

O caminho lento e dificil é a boa e velha dupla inseparável: tentativa e erro. Se formos por aqui, teremos que, no mínimo, considerar algumas coisas mais ou menos óbvias.

SUBSTRATO

O termo “substrato” usado nas floriculturas para se referir àquela terra preta é muito menos técnico. Substrato, ao pé da letra, refere-se aos diferentes tipos de materiais que cumprem a função de reter àgua mantendo um dado nível de arenosidade do solo. Os mais comuns são a turfa, humus e casca de arroz, entre os orgânicos, e vermiculita e perlita, entre os minerais.

Como o substrato vendido comercialmente é, de modo geral, uma mistura desses materiais, é comum que ele apresente alguma mudança de pH que afete a germinação. A acidez do solo pode ser ocasionada por excesso de matéria orgânica, cuja decomposição reage com outros nutrientes, como magnésio e cálcio, formando soluções, que vão embora na água. Justamente por isto, a melhor forma de neutralizar a acidez do solo é adicionando cálcio, que pode ser obtido na farinha de osso, ou no calcário.

Em todo caso, qualquer excesso de matéria orgânica pode ocasionar uma leve acidificação do solo, prejuicando as raízes. Nas pimentas, um ambiente ácido causa o apodrecimento das extremidades da planta, onde se desenvolvem folhas, flores e frutos novos. Também faz a planta atrofiar, e as folhas vão se curvando e endurecendo. Numa primeira olhada, pode parecer alguma praga, bactéria, ou mesmo, infestação de ácaros invisíveis à olho nu. Mas comumente, o problema todo é não mais que a acidez do solo.

A moral da história é que o solo precisa ser ideal. Se você não for usar um medidor de pH para saber a situação do seu solo, melhor não socar as sementes num substrato puro também. Misture o substrato com terra “normal” e não acrescente mais nada além de água. 

SEMEADURA

Como veremos, a pimenteira é uma planta perene, ou seja, ela possui um ciclo de vida que se repete numa dada frequência, e dura até 15 anos. Normalmente, seu período reprodutivo, quando dá flores e frutos, é entre Agosto e Maio. Contudo, por ser sensível ao frio, ela fica dormente nos meses de inverno. Portanto, o ideal é plantar suas sementes assim que começar a esquentar, no final do inverno, ou nas primeiras semanas da primavera.

Plante as sementes no máximo 5cm abaixo do solo (eu uso a falange da ponta do meu dedo indicador como referência). Mantenha o solo úmido, mas não enxarcado, do contrário, as sementes podem até germinar, mas vão apodrecer rapidamente. 

Há quem prefira deixar as sementes mergulhadas em um copo d’água com uma gota de detergente para fazer uma limpeza e garantir a remoção de bactérias e esporos de fungos, que nelas podem estar presentes (eu nunca testei).

Caso você tenha adquirido ou ganhado pimentas in natura e queira remover as sementes para plantar, o processo é um pouco diferente. As sementes de pimenta estão envoltas numa membranazinha, que, se for direto para o solo, pode atrapalhar a germinação e facilitar o apodrecimento da semente por uma retenção excessiva de umidade. O ideal é secar as sementes por três dias ao sol, para garantir a remoção dessa membrana. 

Seja delicado na hora de retirar as sementes. Você vai ver que as pimentas, por mais carnudas que pareçam, são ocas por dentro, e contém uma membrana maior que liga o topo à ponta, e onde se agarram as sementes. Os capsaisinoides e a capsaicina, responsáveis pela ardência da pimenta, são produzidas aí, então é melhor estar usando luva caso a pimenta seja muito forte. Pode parecer exagero para quem só manuseou pimentas leves ou até fortes, mas não nucleares. Não subestimem a liga do milhão: qualquer pimenta com mais de 1 milhão de Scoville Heat Units pode te deixar até temporariamente cego se você encostar nos olhos após tocá-las (mesmo depois de lavar as mãos, e eu digo isso por experiência própria… aliás, vale mencionar, cuidado também com a genitália, tá?).

OUTROS DETALHES

Retomando mais uma vez o prefácio: essas noções de acidez, temperatura e tempo de germinação, contém cada qual sua exceção. Eu já vi muita pimenta brotar só de descartar um fruto danificado num canto qualquer. Mas parece ser mais difícil com variedades muito hibridizadas, como a Primotalii. A Primotalii, que marca 1.4 milhão SHU, é uma híbrida da Yellow Fatalii com a 7 Pot Primo, que por sua vez é híbrida da Trindad 7 Pot Pepper com a Naga Morich.

A temperatura também é extremamente importante para o processo todo. Suas pimentas vão gostar de climas amenos, na faixa de 20 graus, mas suportam uma faixa de 14 à 30 graus. Para além disso, é muito frio ou muito quente. Elas gostam de sol e calor, precisam de luz direta, mas muita luz vai queimá-las, e muito calor vai murchá-las. Porém, mesmo assim, tenho duas lindas black cobras que germinaram na semana mais fria do inverno serrano, quando marca menos de 10 graus tranquilamente. Sempre há exceções, mas seguir o recomendado é mais seguro.

Então vamos amarrar tudo: conhecer a acidez do solo é importante, mas, caso não seja viável, ao menos tente misturar o substrato com um pouco de terra. Você pode plantar suas pimentas diretamente sobre o solo, mas eu prefiro usar vasos para separá-las em caso de pragas. Para a germinação, eu gosto de usar sementeiras. Sementeiras mudaram para melhor todo o processo que eu fazia. Também há quem prefira usar algodão ou papel toalha com um pouco de água. Eu acho mais difícil, mas dá pra fazer. 

CONCLUSÃO

Todas essas dicas são para melhorar seus números, basicamente. Porque se você fizer tudo de qualquer jeito, alguma coisa você vai conseguir, mas pode ser bastante frustrante. Observando à temperatura, umidade e acidez do solo, você com certeza conseguirá bons resultados. Eu considero uma taxa de germinação de 70% excelente, e é onde eu miro. Plantei 20 bhut jolokias vermelhas no verão e 17 germinanaram ao longo de 8 semanas. Portanto, não seja apressado, a germinação pode demorar, então deixe a natureza fazer seu trabalho.

E última coisa: cuidado para não compactar o solo quando for preparar os vasos. Eu gosto de usar vermiculita para semear sementes, mas sei de gente que usa areia. Manter a permeabilidade do solo é importante, da mesma forma que é essencial não deixar o solo compactar. Quem estiver plantando do lado de fora (outdoor) vai perceber que, com o tempo, o solo compacta por erosão (principalmente chuva) e acaba eventualmente expondo as raízes da planta. Durante a germinação, isso pode ser um problema porque o solo compacto vai atrapalhar o crescimento da raiz, e a planta pode não conseguir brotar. Apenas prepare o solo com delicadeza, e suas chances serão muito maiores nesta etapa.

Tudo dando certo, nos vemos na semana que vem!